Fidel, seu povo e os novos aprendizados imprescindíveis
Date:
Source:
Auteur:
Foram poucas as figuras da história contra as quais foi empregada uma maquinaria de demonização como a que foi utilizada contra Fidel Castro; talvez com nenhuma tenha sido gasto tanto dinheiro, não somente para liquidá-lo fisicamente, mas também para exterminá-lo moralmente. Lançaram mão de pós para deixá-lo sem sua lendária barba, até substâncias para que começasse a rir sem controle diante do público, elaboradas nos laboratórios da CIA. Mas nenhuma quantia supera o financiamento das campanhas de propaganda, carregadas de calúnias e mentiras contra a Revolução Cubana, que tiveram como alvo predileto, ainda depois de morto, seu principal condutor.
Como poderia ser explicada, então, a contradição entre essa realidade e o fato incontestável de que, onde quer que ele viajou, inclusive ali onde eram cotidianas as infâmias contra a sua pessoa, fosse aclamado fervorosamente pelas multidões, e cumprimentado respeitosamente por adversários políticos e ideológicos?
Contestando à explicação medíocre da «liderança carismática» com a que alguns escritores querem incutir nele o fervor inconsciente que podem provocar os demagogos, Fidel é um líder ético, com carisma indiscutível, porém a sua diferença com outros carismas assenta em que acompanhou as suas palavras com «fatos e realizações concretas», não mentiu jamais e cada dia acordou pensando o que fazer pelos demais, dando o constante exemplo pessoal de ir sempre na frente e dar a cara, tal como exigiu o povo cubano daqueles que reconheceu como seus líderes autênticos, desde Carlos Manuel de Céspedes até hoje. A estatura moral de quem age deixando claro que, ainda que a causa que está defendendo seja muito alta, o fim não justifica os meios, faz brilhar e distingue Fidel na geopolítica internacional.
Fidel também não é aquele que mantém os seus na escuridão, a fim de aproveitar a ignorância e manipular com facilidade, mas quem afirmou muito cedo que «não vamos dizer ao povo: acredita; dizemos-lhe que leia»; aquele que compartilhava em seus discursos dados e argumentos sofisticados, investigados minuciosamente e expressos com uma lógica impecável e uma pedagogia política consistente. A transformação educativa que liderou foi capaz de converter um povo, onde eram comuns os analfabetos totais e analfabetos funcionais, em protagonistas de façanhas científicas, culturais e militares, que apenas podem nascer de um desenvolvimento em massa das inteligências que o capitalismo tornou invisíveis com a exclusão classista de uma república idealizada por seus inimigos, mas constatada por ele e seus companheiros com suas mais dolorosas inequidades.
Mas o apego à ética e à obra educativa não bastariam para explicar a vitória fidelista sobre seus demonizadores, que vai crescendo com o tempo. Seu manuseamento hábil e criativo da comunicação, seu senso do contragolpe arrasador perante a calúnia ou a adversidade e as consciência da importância do simbólico, são evidentes desde os começos de sua atividade política. Ele é o estudante que desafiou a politiquice reinante, ao trazer para Havana um ícone, como foi o sino de La Demajagua; o candidato a representante da Câmara que caminhava e visitava cada casa, no bairro de Cayo Hueso e enviou uma carta a cada eleitor; aquele que após ter sido preso depois do ataque ao quartel Moncada foi fotografado na casa de detenção, em Santiago de Cuba, justamente diante do retrato de José Martí, o que estando preso no cárcere pediu às suas companheiras publicar e distribuir, clandestinamente, a sua alegação de defesa, que continua sendo hoje um best seller mundial. Fidel foi o chefe que, em meio das mais agudas carências, em uma guerrilha na qual faltou de tudo, menos a convicção e a coragem, recebeu no primeiro reforço braceletes e uniformes; foi quem percebeu a importância estratégica da Rádio Rebelde e determino sua proteção como um dos três objetivos principais perante a ofensiva da ditadura de Batista, no verão de 1958.
Fidel foi o que, mal nascendo a Revolução, ao perceber as campanhas contra ela, organizou a Operação Verdade; encorajou a fundação da Casa das Américas para o diálogo com a intelectualidade latino-americana; a agência Prensa Latina e Radio Habana Cuba, para difundir a verdade de Cuba; o Instituto Cubano de Amizade com os Povos para cultivar a solidariedade de dupla via e, em meio de grandes tensões, dedicou tempo e de a máxima atenção a intelectuais que visitam o país, como Graham Greene, Jean Paul Sartre e Simone de Beavuoir. Seu senso acerca do mais simbólico, não como algo vazio, mas sim como testemunho vivente do que é a Revolução, está na transformação dos quartéis em escolas, que chega até o século 21, com a criação da Universidade das Ciências Informáticas, onde houve antes uma estação de monitoramento radioeletrônico.
Seu diálogo com o jornalista franco-espanhol Ignacio Ramonet, é uma cátedra acerca da falácia da liberdade de imprensa que o capitalismo preconiza, o valor que concede à crítica dentro do socialismo e a importância da cultura e da educação perante os desafios que coloca na nossa frente o poder midiático imperialista da comunicação.
«Chegamos à convicção de que é necessário desenvolver muito mais o espírito crítico. Eu estimulei isso ao máximo, porque constitui um fator fundamental para aperfeiçoar nosso sistema».
«Sabemos que há inconvenientes, mas queremos uma crítica responsável».
«Apesar das possíveis consequências, tudo é melhor do que a ausência das críticas».
(...)
«Se alguém chamar liberdade de imprensa ao direito da contrarrevolução e dos inimigos de Cuba de falar e escrever livremente contra o socialismo e contra a Revolução, caluniar, mentir e criar reflexos condicionados, eu diria que não somos a favor dessa ‘liberdade’».
«Enquanto Cuba seja um país bloqueado pelo império, vítima de leis iníquas, como a Lei Helms-Burton ou a Lei de Ajuste Cubano, um país ameaçado até pelo próprio presidente dos Estados Unidos, nós não podemos dar essa “liberdade” aos aliados dos nossos inimigos, cujo objetivo é lutar contra a razão de ser do socialismo».
«Nesses órgãos da mídia “livres”, quem fala? De que falam? Quem escreve? Fala-se o que querem os donos dos jornais ou as emissoras de televisão. E escreve quem eles determinam. Você sabe muito bem. Fala-se em “liberdade de expressão”, mas realmente o que se está defendendo, fundamentalmente, é o direito de propriedade privada dos meios de divulgação em massa».
(...)
«Nós sonhamos com outra liberdade de imprensa, em um país educado e informado, em um país que possua uma cultura geral integral e se possa comunicar com o mundo».
É por isso que Fidel criou espaços como a Mesa Redonda e Universidade para Todos. Quando a então Repartição de Interesses dos Estados Unidos em Havana começou a dar aulas de inglês em sua sede, como parte dos planos subversivos, Fidel encorajou os cursos de inglês pela televisão. E quando lhe perguntaram o que fariam os cubanos com a Internet, respondeu com a velocidade de um raio: «Falar com os norte-americanos em inglês».
Sua confiança no povo, ao qual organizou e educou, era infinita, precisamente a partir dessa educação e organização, mas nunca subestimou a necessidade de dar explicações profundas, perante temas complexos, tal como fez em um longo comparecimento na televisão, em que preparou os cubanos para receber com sucesso o papa João Paulo II, quando toda a imprensa internacional anunciava que esse seria o anjo exterminador do socialismo cubano.
Justamente nestes dias, nos quais as notícias falsas correm como o vento, é comum a exploração de reflexos condicionados nas pessoas, para levá-las a reagir emotivamente diante de uma imagem ou manchete, sem antes parar e fazer uma análise mínima de fontes e contextos, e isso traz de volta a este batalhador a favor da verdade que é Fidel. Quando a tecnologia e o dinheiro convertem mentirosos profissionais em líderes de opinião e aqueles que repetem as fórmulas que conduziram o mundo ao desastre em que se encontra em grandes gurus que nos estão propondo novas fórmulas salvadoras, justamente na hora em que o capitalismo e a democracia representativa afundam no descrédito e eles não têm nada com que contribuir; o método fidelista de converter o povo em protagonista de sua própria defesa e muni-lo dos mais altos conhecimentos, transformando e potencializando para isso a institucionalidade revolucionária, resulta um tesouro ao qual devemos acudir de maneira criativa e consequente.
A articulação com o objetivo de criar a partir das bases da sociedade cubana um receptor crítico e um cidadão capaz de usar de modo criativo e emancipador as Tecnologias da Informação e da Comunicação, não se pode conformar com a alfabetização informacional. Precisa-se com urgência de um processo dinâmico e dinamizador que, tal como apelou o presidente Díaz-Canel, permita «aproveitar todas as nossas potencialidades», porque «não podemos continuar ancorados em formas de comunicar anteriores à época digital, e não podemos burocratizar os processos ideológicos».
Mais do que criar habilidades, é necessário formar uma sólida cultura da comunicação, não somente nos diretivos, mas sim em nível de todo o povo, utilizando para isso a escola, os meios de comunicação e as estruturas de base das instituições e as organizações políticas e de massa, para converter cada cidadão em um defensor ativo da verdade e um crítico responsável para com aquilo que esteja mal, provido de um conhecimento que lhe permita utilizar o caminho mais eficaz e rápido para converter a crítica em participação e solução.
O país com mais professores em cada habitante, aquele que baniu em menos de um ano o analfabetismo e que pintou a Universidade de «negro, de mestiço, de operário», que com ações de comunicação política libertou o garoto Elián e que conseguiu o retorno dos Cinco, não se pode propor menos, nem o vai permitir a memória daquele que ficou à frente do seu povo, para vencer todas estas batalhas.